8.4.08

Do Desacordo Ortográfico na Lusofolia...

A questão não é linguística e sobressaiem até dúvidas de que deva sê-lo. É política, é cultural, é social. É a relação real entre os países da suposta lusofonia. É a manifestação exacta de como se suportam, uma vez tolhida a máscara da hipocrisia com que se apertam as mãos e fazem os seus negócios. Falamos de um desentendimento profundo e histórico sobre uma forma de estar; sobre a afirmação de uma independência que ainda sente feridas, de uma discórdia antiga mal curada. No fundo, o Desacordo é o resumo das relações ditas lusófonas: um completo fiasco diplomático. E há ainda quem se arrisque a falar de fraternidade... Optimistas distraídos, políticos desonestos, utopistas da língua, liberias, conservadores, que importa?
Numa entrevista dada à RTPN, ontem, 07/04/08, por video-conferência, o Embaixador do Brasil em Portugal, falava da necessidade de apresentar à União Europeia e a outros orgãos Internacionais documentos com uma grafia consensual sempre que se apresentassem na língua portuguesa, independentemente do país "lusófono" de que proviessem ou a que estivessem destinados. O problema, reconhecia, estava em, precisamente, adquirir esse consenso e balizar os parâmetros porque devesse tal consenso reger-se.

Temos então que, o que se considera serem necessidades está, já se viu, bem definido. E, sendo assim, porque não consegue ninguém entender-se?

A resposta a esta dúvida é por demais evidente:

De um lado, acha-se o orgulho golpeado do "proprietário" inventor da "língua-mãe" (repare-se que eu alargo o sentido do termo) que a vê "vilipendiada" por falantes antes seus colonizados que a"deturparam intoleravelmente". Do outro, uma maioria de largos milhões de habitantes que pretende por todos os meios ao seu dispôr afirmar a tal independência (que também se manifesta pela língua) e que não se mostra disposta a alterar o seu modo de falar que é também, não se tenham dúvidas sobre isto, um modo de estar, e de ser como nação, como comunidade com valores comuns.

Convém como tal verificar:

Entre os países desta Lusofonia, é mais o que os une ou o que os separa? Relembrando a música dos Cabeças no Ar (»Primeiro Beijo» João Monge/João Gil), poderiamos dizer (numa analogia aceitável) que este primeiro beijo que deram após o erguer do pano branco, foi dado para a tela do cinema, para a representação de relações políticas e manifestações de "carinho" de fachada, para a fotografia internacional, para a viabilização das transferências bancárias, e, por isso, não pegou.

Deste modo, ou bem que se assume que (apesar de com a mesma base) cada país tem a sua língua (com muito de crioulo e/ou de marcas de outras línguas, etnias, influências) e segue o seu caminho honestamente independente, ou bem que se assume que a língua é a mesma e que é da maior vantagem que se aproveite e conjugue a riqueza cultural e linguística de cada conjunto de modo a obter-se uma llíngua mais completa e versátil, cujo uso seja um prazer para todos, que para todos represente a mesma afirmação, que seja algo com que se identifiquem naturalmente, como parte do mesmo património, independetemente do nome do páis ser Portugal, Brasil/Brazil (decidam lá a grafia ou cada um o escreva como quer!), Timor Loro Sai (como se escreve?), Moçambique, Angola, São Tomé e Princípe ou Cabo Verde ou Marte nº2 da 3ª Galáxia a contar da esquerda do 3º Sol da Estratosfera...

A julgar porém por tanta dificuldade, eu diria que já neste momento se tornou evidente que há muito que se falam línguas diferentes. No Brasil precisam até (ouvi dizer por línguas muito más) de legendas para perceber... o português? Mas, bem vistas as coisas, também os franceses precisam de legendas para entender o... "quebequiano". E, no entanto, a grafia, creio, é a mesma. Ou será que não é? E porque é que ninguém ouve os franceses discutirem o assunto e organizarem palestras sobre "francofonias"? E o conceito de "francofonia" até existe. Eu tive até o desprazer de o conhecer pessoalmente nesses bonitos locais que são o plat pays e o prado ideal de La Vache qui Rit.

Porquê então tanto zumzum com um acordo? Alguém pensa em acordar o mandarim com o japonês só porque para um ocidental o alfabeto tem o mesmo tipo de desenhos (frase herética para alguém dos lados do Sol Nascente)?

Meditemos então meu amigos, e não brinquemos às guerras de Alecrim e Manjerona, pelejando à toa sobre coisa nenhuma. Isto é assunto de feira, que se quer tratado com a leveza de um desfile de modelos (na perspectiva do admirador de pernas).

Se as ditas pernas o deixarem com dificuldades de concentração, escreva a matéria de cogitação numa folha branca e, bem vistas as coisas, tendo em conta o cenário actual...

Nao se importe com os erros, "pá"!

2 comentários:

Anónimo disse...

"...Brasil/Brazil (decidam lá a grafia ou cada um o escreva como quer!)..."

Portuga burro da porra! Brasil na língua portuguesa sempre se escreveu de uma maneira só. Várias línguas escrevem o nome do meu país de forma diferente:

Brazil - inglês
Brasilien - alemão
Brasile - italiano

Só mesmo um portuga burro desdentado e mascador de bacalhau podre como você é que não sabe disso.

Miguel João Ferreira disse...

Exmo Sr. Comentador Anónimo,
Acima de tudo, tenho de lhe agradecer:
Agradeço-lhe em primeiro lugar o ter-me lido.
Em segundo lugar, o ter-se dado ao trabalho de comentar o meu texto - abdicar, mesmo que por instantes, da sua vida própria, que tenho a certeza de ser extremamente rica e interessante, para comentar algo escrito por mim, pode apenas dignificar o que faço e provar que me tem ao mais alto nível, mesmo que o que escreve demonstre algumas questões por resolver, como por exemplo uma grande sensação de revolta e alguma frustração interior.
Em terceiro lugar, agardeço a breve exposição que fez da sua enorme erudição poliglota, bem como a sua correcção essencial. Efectivamente, é em língua inglesa que Brasil se escreve Brazil e, mesmo no Brasil, Brasil é Brasil e não Brazil. Ainda não li suficientemente Jorge Amado nem assisti a suficientes episódios das telenovelas da Globo para ter interiorizado este pormenor vital mas há algo que lhe asseguro: não voltarei a repetir este erro.
Em quarto lugar, agradeço-lhe o carinho que demonstrou por mim ao preferir tratar-me imediatamente por tu. Mostra que o seu inconsciente se projecta até mim pleno de afecto, e entendê-lo dá-me, confesso, uma certa comoção. Perdoe-me se não lhe aplico o mesmo tratamento, mas fazê-lo seria aproximar-me do seu nível, acompanhar a sua categoria de pessoa, e eu não me sinto digno disso, se é que me entende.
Devo também agradecer-lhe (quinto agradecimento, repare-se) o uso que fez do vernáculo luso, e a menção que fez a um elemento típico da nossa gastronomia. Entendi, nessa escolha de palavras (como não podia deixar de ser, por não se tratar de outra coisa), um esforço honesto da sua parte de se aproximar da nossa cultura, dos nossos costumes, do que pode talvez considerar-se, de um modo geral, a nossa forma de ser. É um esforço que merece um aplauso, mesmo que precise de uma ou de outra correcção. Mas nada que umas poucas aulas de etiqueta - com por exemplo essa figura de referência incontornável que é a Sra. D. Paula Bobone, para o seu vocabulário e os seus modos brilharem mais do que cristal.
O meu sétimo e último agradecimento (e calha bem serem 7 porque este número é muito simbólico, como por certo sabe - não me lembro se houve para trás um sexto, mas corrija-me por favor a matemática se reparar que também aqui falhei, mostrando que tenho muitas dificuldades a contar), vai para o facto de, através do seu generoso comentário, ter provado, de forma inquestionável, o meu ponto de vista. O "Desacordo" é de tal ordem que o seu discurso - bem intencionado, é certo, mas (tem de admitir) completamente atabalhoado e desconexo (porventura reflexo da sua personalidade por curar?) - não achou modo de se fazer entender devidamente. Talvez se o tivesse escrito com legendas...
Uma última nota, quase trivial, mas que julgo ser importante esclarecer, em nome do bom nome, já que, apesar da sabedoria que de uma forma geral rege o seu discurso, se conclui que também o senhor é um homem mal informado:
Eu não masco bacalhau (de que aliás não sou grande apreciador - nem conheço português que o faça - talvez algum brasileiro creia que o bacalhau é digerido por via da "mascação"? -mas nunca ouvi falar de tal tradição no Brasil...); masco, isso sim, pastilha elástica e ocasionalmente meio pau de canela, mas só se vier acompanhado de um café. Das poucas vezes em que me apresentam uma refeição de bacalhau que aceito torcendo o nariz, na minha tentativa de o comer, mastigo-o, não o masco. Há uma diferença que poderá consultar num bom dicionário - por ser imparcial, eu sugiro-lhe o Aurélio, ainda que pessoalmente prefira o Candido de Figueiredo.
Também se acha mal informado quando afirma que sou desdentado. Perdi apenas dois dentes, de modo cirurgicamente controlado, para dar espaço aos restantes, que cresceram airosos e belos como não podia deixar de ser. E estão tão lá para trás que nem abrindo muito a boca à Mick Jagger em frente ao espelho consigo ver um espaço vazio.
Deverei supor que me faz essa observação prque o Sr. (ou a Sra. D.?) usa placa?
Deixo ainda uma nota de louvor para o seu título que considero extremamente poético. Aquele abraço,
M.